Fonte: Folha de São Paulo
Primeira "operadora virtual" de celular, a seguradora Porto Seguro prepara sua entrada em um ramo em que a maioria dos clientes está insatisfeita com os serviços. No negócio, a Porto aluga a rede de uma operadora e responde pelo atendimento, cobrança e serviço ao cliente. O presidente da empresa, Jayme Garfinkel, diz que a ideia não é competir com as grandes teles, mas sim oferecer mais um diferencial para segurar seus clientes.
"Eventualmente o preço da Porto é maior, mas olha o que ela te dá: assistência residência, computador, vantagem com cartão e com celular. No fundo fica mais barato que o preço do concorrente."
Apesar disso, Garfinkel diz que se preocupa com o fato de hoje a Porto Seguro ter uma imagem boa junto aos clientes e estar entrando em um setor conhecido pelo mau atendimento.
A Porto Seguro é hoje uma das oito empresas que operam no país consideradas como "worldclass" (padrão internacional) de qualidade de serviço, segundo pesquisa da consultoria CVA.
Por "world class", afirma a consultoria, entenda-se um serviço em que o cliente não só aprova a qualidade, como se diz supreendido pelo atendimento a ponto de pagar mais por isso e ainda recomendar a outras pessoas.
"O cliente vai dizer que comprou Porto Seguro...", disse Garfinkel, que atribui a reputação da empresa à sinceridade com que trata os clientes.
"Não tem problema de errar. Mas tem que reconhecer e consertar o erro. Sou o primeiro a ir de joelhos pedir desculpas ao cliente", disse.
Folha -Vocês não temem arriscar sua aprovação num serviço que é constantemente reprovado pelo cliente?
Jayme Garfinkel - Estamos muito preocupados de entrar numa área que a gente não conhece. Mas temos a humildade de estar nos preparando.
Na vida é assim: ou você cresce ou vai para trás. Para nós, a oportunidade de entrar é mais um argumento diferencial para vender nosso produto para o cliente. Vamos fortalecendo a casca de proteção para não perdê-lo. O corretor usa como argumento que oferece um guincho com qualidade, além do cartão de crédito e agora tem mais uma novidade: um celular.
Como estão os preparativos?
Estamos pensando há meses como vamos fazer. Estamos procurando espaço e gente. Mesmo que tenha inicialmente uma ociosidade na central, não tem problema. No nosso caso, a preocupação é maior. O cliente está esperando um tratamento diferente. Ele vai dizer: eu comprei Porto Seguro...
É lógico que a expectativa das pessoas cresce.
Estamos preocupados sim, mas a gente tem essa vantagem de que a operação deve crescer mas lentamente, como o cartão.. A gente teve problemas de atendimento no cartão muito complicados. Como foi crescendo aos pouco, deu para ir melhorando. Não adianta contratar mil pessoas e sair vendendo.
Mesmo se colocar 2.000, precisa treinar e criar atendimento.
Como a Porto Seguro, que não é do ramo, vai fazer um serviço melhor do que é oferecido?
Não é porque o outro é mais tonto do que nós que ele atende mal. É porque ele tem um volume de atendimento brutal. No nosso caso, como serão poucos clientes, é uma operação de butique. Somos uma butique de atendimento. A gente acredita que vai dar conta.
Os concorrentes dizem que a Porto entrará no celular porque, se o cliente se sentir tentado a mudar de seguradora, vai pensar duas vezes antes de perder o celular. Isso pesou na decisão?
A gente pensa em tudo; sinceramente, pensamos mais em ter um diferencial. Quando a gente lançou o cartão de crédito, pensamos que seria o primeiro instrumento do corretor para vender um produto novo para o cliente e que depois seria um instrumento poderoso [para renovação]. E isso funcionou.
Agora, quando apareceu a ideia do celular, a gente percebeu que o nosso ganho seria ter uma novidade que vinculasse o cliente com a gente. Eventualmente o preço da Porto é maior, mas olha o que ela te dá: assistência residência, computador, vantagem com cartão e com celular. No fundo, fica mais barato que o preço do concorrente. A gente treina o corretor para ele mostrar ao cliente que o custo com assistência residência etc é maior. É uma venda que precisa mostrar esse diferencial.
Qual o segredo da boa reputação da Porto?
Juro que não tive uma inspiração nem dei ordem nenhuma. Pela origem, diria que é a preocupação com o corretor... Se o cliente de um corretor tem um problema, podemos desagradar a todos os clientes desse corretor. E eles vão embora. O funcionário tem de se sentir atuante e saber que tem poder de decisão. Quem está na ponta atendendo o cliente não sou eu. Não dá para dizer simplesmente: atenda bem. Isso vem com a cultura da empresa. Há um ano e pouco eu vim com minha mulher para mostrar como era o atendimento. Era um domingo, às 13h30. Enquanto a coordenadora explicava como funcionava o atendimento, eu escutava, de orelha, um atendimento. O atendente perguntava: 'Mas o guincho não chegou?' Nosso prestador não tinha recebido a mensagem de confirmação de que o guincho estava indo para o local. Então, decidiu mandar um segundo guincho. Outro gerente diria que ele gastou duas vezes com o mesmo caso. Eu fiquei encantado com isso... Muitas vezes o cliente liga aqui e o prestador não consegue localizar a apólice. Na dúvida, é melhor atender.
Ele tem uma sensibilidade de saber se é um caso grave, se é uma mulher sozinha, que está num lugar perigoso... Manda atender!
Tem que mimar o cliente?
O cliente não quer ser mimado, mas tem que ter alguma coisa que ele não espera, como um serviço rápido. A gente entrou em segmentos em que o atedimento antes de nós era fraco. Vinha um cara sem uniforme, sujo, um guincho feio... Se você esperava um sujeito sujo e veio um limpo, já está ótimo. Hoje, o mercado de seguro de automóveis como um todo tem padrão internacional. Não é só a gente.
Como uma empresa pode se relacionar bem com o cliente?
Não importa que você tenha errado, mas tem que mostrar ao consumidor, humildemente, que está consertando o erro e que está do lado dele. Ele é um ser humano que também erra. O perigoso é a empresa ficar arrogante e negar que erro. Se errei, sou o primeiro que vou, junto com o funcionário, de joelho perdir perdão. Mas tem casos em que a gente tem que negar o pagamento. Tem caso de fraude. Nesses casos, tem que agir com franqueza e dizer: isso os senhor não contratou. Tem uma teoria dos consumeristas que dizem que a empresa tem que dar tudo ao consumidor. Não dá para dar tudo senão quebra. O não bem explicado é admissível. Não tenho medo de dizer não. Atendimento é franqueza.
É difícil expandir levando qualidade para outras áreas?
Parece que sou muito ambicioso; sou ambicioso em ter o melhor atendimento, mas não ser a maior empresa. Levamos 20 anos para ter uma expansão nacional.
A gente subsidiava sucursal. Em Recife não tinha volume de cliente para manter uma operação. É o preço para entrar bem lá. Como o crescimento é lento, você vai tendo tempo de ir se estruturando. O risco de uma empresa é o crescimento vertiginoso, em que se perde o controle. Soma uma série de fatores que não consegue atender. Devagar a gente chega lá; se tiver muita ambição pode quebrar.
Vocês esperam que, como o nível de serviço da Porto, as demais operadoras fiquem constrangidas com o atendimento?
Espero que eles nem reparem em nós.
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