Fonte: Revista Consultor Jurídico - Data: 01/04/2006
por Fernando Porfírio
O delegado Reinaldo Correa, acusado de envolvimento no escândalo dos seguros da Porto Seguro, não conseguiu suspender nem o processo a que responde, nem seu interrogatório. A 10ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça negou Habeas Corpus e revogou, por votação unânime, medida liminar a favor do delegado.
Reinaldo Correa responde a processo junto com outros 10 réus, por formação de quadrilha, denúncia caluniosa, estelionato, uso de documento falso e extorsão. Os réus são dirigentes da seguradora Porto Seguro, da WSN — uma empresa de consultoria de informações do mercado automobilístico —, além de policiais civis, entre eles três delegados.
Todos são acusados de aplicar golpes em clientes com seguros de automóveis. A liminar, proferida em setembro do ano passado pelo desembargador Jarbas Mazzoni, suspendia, temporariamente, o interrogatório dos acusados perante a 23ª Vara Criminal de São Paulo.
No recurso ao TJ paulista, o delegado reclamava a suspensão do processo e do interrogatório. Os advogados dele sustentaram que havia ilegalidades na colheita de provas por parte do Ministério Público e no recebimento da denúncia pela juíza Sônia Nazaré Fernandes Fraga, da 23ª Vara Criminal de São Paulo.
A denúncia foi apresentada no ano passado pelo Grupo de Atuação Especial de Controle da Atividade Policial. As investigações tiveram o apoio da Abin — Agência Brasileira de Inteligência.
No Tribunal de Justiça, o relator da matéria, Nuevo Campos, entendeu que o representante do Ministério Público tem o poder de requisitar a instauração de inquéritos policiais e diligências apuratórias, bem como o dever de exercer o controle externo da atividade policial.
Para a turma julgadora, desde que não seja praticada ofensa a direito individual, o MP não está impedido de promover apurações para colher elementos para a formação de sua convicção, condição indispensável ao exercício da atividade da instituição.
“A instauração da ação penal, nas hipóteses de crimes de ação penal pública incondicionada, por disposição constitucional, é de titularidade exclusiva do Ministério Público e o oferecimento da denúncia não tem como pressupostos prévia apuração do ilícito penal em sede de inquérito policial, o que está expresso, inclusive, no artigo 513 do Código de Processo Penal”, afirmou o relator, que foi seguido pelos desembargadores David Haddad e Raul Motta.
Acusação
De acordo com a denúncia do MP, a quadrilha falsificava documentos no Paraguai e na Bolívia e os usava para convencer segurados que haviam tido seus carros roubados a não cobrar o reembolso do valor do seguro. Segundo a denúncia, em muitos casos, as vítimas ainda eram obrigadas a pagar por uma taxa pela suposta investigação feita pela seguradora.
Os supostos golpes teriam lesado pelo menos 20 pessoas. Com o apoio da empresa WSN, de consultoria de informações do mercado automobilístico, a seguradora conseguia documentos falsos de venda do veículo no Paraguai e na Bolívia. Estes papéis, de datas anteriores às dos roubos dos carros, davam conta que os proprietários haviam vendido os carros fora do Brasil. Assim, a seguradora acusava as vítimas de terem tentado fraudar o seguro.
Ainda conforme a denúncia, as ocorrências eram sempre registradas na 27º Delegacia de Polícia de São Paulo (Ibirapuera), onde as vítimas eram ameaçadas de se tornarem indiciados por tentarem fraudar o seguro. Após a ida à delegacia, muitas delas concordaram em abrir mão de receber o dinheiro a que teriam direito da seguradora. Em parte dos casos, a vítima ainda pagava pela falsa investigação.
Segundo o MP, para aplicar o golpe, a quadrilha contava com o apoio de dois advogados paraguaios, identificados como Lorenzo Almirón Armoa e Abelardo Antonio Candia Mamirez. São réus na ação os delegados Reinaldo Corrêa, Guaraci Moreira Filho e Enroljas Rello de Araújo, os escrivões Geraldo Picatiello Júnior e Sérgio Antônio Lopes, além dos dirigentes da Porto Seguro Joel Rebelato de Mello, Luiz Paulo Horta de Siqueira e Nelson Peixoto, do advogado Carlos Alberto Manfredini e dos sócios da WSN, Nanci Concílio de Freitas e seus filhos Karla e Marcos Rodrigo.
Suposta vítima
Uma das supostas vítimas das fraudes denunciadas pelo Ministério Público teria sido o aposentado José Eulálio Ramos, que já chegou a ser condenado em primeira instância. Ele responde por simular o roubo do seu carro para tentar obter a indenização da Porto Seguro. Segundo os autos do processo onde é réu, ele vendeu seu veículo no Paraguai dias antes de registrar o boletim de ocorrência do roubo.
Os advogados do aposentado, Carlos Ely Eluf e Décio Eduardo de Freitas Chaves Júnior, entraram com um pedido de Habeas Corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo. Eles pretendem trancar a ação penal contra Ramos.
No pedido, relatam o esquema de fraude que, segundo o Ministério Público, teria sido montado pela seguradora e por autoridades policiais. Afirmam que o aposentado está sofrendo uma “injustiça”, que deve ser reparada.
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